Marina Helena

O fundo eleitoral distorce a democracia

Após a proibição das doações de pessoas jurídicas para campanhas eleitorais, o Congresso aprovou o Fundo Especial de Financiamento de Campanha (fundo eleitoral) com duas principais justificativas. A primeira seria evitar a corrupção, já que um doador privado que financiasse uma campanha poderia querer favorecimentos em troca. A segunda seria democratizar o acesso ao poder, tornando as eleições mais igualitárias e competitivas e evitando que os candidatos ricos obtivessem vantagens sobre os demais.


Afinal, quem não quer eleições mais limpas e isonômicas? Mas será que usar altos montantes de dinheiro público é o caminho para isso? Uma análise da realidade mostra que a lógica é inversa. O fundo eleitoral não apenas não evita a corrupção — e as já comprovadas candidaturas laranja são uma prova disso —, como ainda torna ainda mais difícil a alternância de poder e renovação, concentrando os recursos em poucos candidatos, justamente nos mais ricos e naqueles disputando a reeleição.



Analisando os recursos alocados em candidatos a deputado federal em 2018, a primeira e única após o advento do fundo eleitoral, percebemos que, em nove partidos, 50% dos recursos foram concentrados em menos de 5% dos candidatos. PSL, PCB e PSTU, por exemplo, gastaram mais da metade de tudo o que receberam com apenas dois candidatos.

Além disso, candidatos com patrimônio declarado acima de R$ 2 milhões receberam em média R$ 408 mil, mais de oito vezes o valor médio de R$ 47 mil recebidos por candidatos que declararam patrimônio de até R$ 100 mil.

Por fim, deputados em exercício receberam, em média, R$ 996 mil, mais de dez vezes o valor médio de R$ 93 mil destinado a candidatos novatos.

Esses dados estão detalhados no estudo “Fundo eleitoral e a falácia da democratização do acesso ao poder”, que fiz em coautoria com Sebastião Ventura para o Instituto Millenium.

Estes já seriam argumentos suficientes para a redução do fundo eleitoral brasileiro, mas gostaria de citar mais um: a população brasileira (a que paga a conta) é contra a sua existência.

Em pesquisa encomendada pelo Instituto Millenium, 75,7% dos entrevistados se declararam contra o Fundão, nove entre dez afirmaram que o STF deveria reduzir o valor, e 96% preferiam que esse dinheiro fosse aplicado na Saúde e na Educação.

Além disso, a pesquisa mostrou que a intuição do brasileiro está de acordo com a realidade. Mesmo sem conhecer os números, 68,9% disseram que a distribuição do fundo faz com que os mesmos políticos sejam sempre eleitos, 65,6% discordaram que ele torna a eleição mais justa entre ricos e pobres, e 77,3% acreditam que ele não acabou com a corrupção, nem com o caixa 2 nas campanhas.


O Brasil é um ponto fora da curva na magnitude da utilização de recursos públicos. Analisando como o financiamento de campanhas funciona em outras democracias, a Alemanha parece ser um bom exemplo. Os partidos têm três fontes de receita principais: financiamento estatal, contribuições dos filiados e doações privadas.


O financiamento público é maior quanto mais votos os partidos receberam nas últimas eleições e quanto mais receberam em contribuições dos filiados e em doações privadas, dando incentivo para que os partidos se esforcem em conquistar mais filiados e doações. Isso poderia tirar as legendas brasileiras do conforto de utilizar recursos públicos para se perpetuar no poder e fazê-los se esforçar para construir bases sólidas e se aproximar do seu eleitor.

Marina Helena

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